.

domingo, 27 de janeiro de 2008

Divagações de uma manhã de domingo

Da janela de um apartamento em uma grande cidade brasileira, fico a observar as placas publicitárias e as fachadas de casas comerciais e bancos.Estrelas, símbolos, imagens do que seria a vida perfeita.Imagens a serem vendidas, a serem empurradas goela adentro de todos que se atrevem a olhá-las.A publicidade realmente tem evoluído em parceria com tudo do que há mais moderno na psicologia e em todas as tecnologias.Marketing agressivo, as propagandas saem em busca de suas vítimas potenciais como mísseis teleguiados.E nessa busca por clientes, elas acabam também por atravessar bolsos vazios ou consciências estranhas.Consciências que de alguma forma conseguem se manter afastadas do jogo, porém, não imunes a ele.Pois de qualquer forma, é uma tarefa impossível não esbarrar os olhos num anúncio do Bradesco ou tapar os ouvidos para os sussurros dos cartões visa.Há quem diga ser esse tipo de coisa uma arte, e eu não discordo de tal afirmação, afinal, o que não é arte?Não estou aqui para ter ressentimentos por não ter um cartão visa no bolso ou não poder consumir a grande maioria de produtos que me é oferecido diariamente, mas sim para questionar os caminhos que tudo isso tem levado o mundo. O ressentimento, como já dizia o grande Nietzsche, é um merda, e um ponto inicial muito perigoso para qualquer contestação. É uma afirmação de poder do objeto criticado, poder esse que no caso da propaganda, não pode ser de forma alguma desconsiderado ou ignorado.A propaganda tem poder, tem influência, tanto naqueles que se deixam levar na correnteza consumista como naqueles que param para tecer críticas.Ora, estamos todos num mesmo barco chamado terra, embora em diferentes realidades, em diferentes regiões geográficas do planeta,mas no entanto, temos convivido com as mesmas marcas, os mesmos costumes, olhando impávidos o massacre de culturas milenares e assistindo a um processo de aculturação virtual sem precedentes na história mundial.Tudo o mais se tornou secundário, religião, filosofia,ciências.O capitalismo se tornou, por assim dizer, a mãe de todos os pensamentos, englobando praticamente todos os processos interpretativos do ser humano atual.E dentro desse oceano do qual desconhecemos dimensões ou profundidades, tentamos respirar o ar da superfície, se é que isso seja possível. Tentar pensar a nossa época, isso é praticar a criatividade tentando romper as barreiras mercantilistas do mundo atual.


YON

sábado, 26 de janeiro de 2008

Pensamento e algumas contradições


Linearidade argumentativa, coesão, encadeamento lógico, coerência, precisão lingüística, racionalização dos conteúdos; são algumas máximas frequentemente enunciadas e associadas – quase que automaticamente – às maneiras de pensamento. Aqui estamos nós, diante do suposto maior patrimônio da civilização: o “pensamento racional”. Essa perspicaz junção moralizante que nos amordaça, disfarçada de redundância!

Parece que a necessidade de ordenar as coisas se alastra e reformula-se com uma rapidez assombrosa. Desde que as bases da racionalidade começaram a ser lançadas – mais especificamente, porém não unicamente, nos momentos iluministas que não se prendem a uma determinada data ou lugar – a vida humana tem se orientado por valores transcendentes que passaram a direcionar toda a existência, delimitando rigorosamente as espacialidades permissíveis, as intensidades saudáveis, as maneiras corretas, as quantidades desejáveis, as temporalidades adequadas, os produtos eficientes... Os dogmas racionais, infalíveis na missão de modelar imponentes e destemidos seres do conhecimento verdadeiro, incorporam novas revitalizações na contemporaneidade e continuam aliciando multidões de “fiéis céticos”.

A Lógica, com suas diversas aplicabilidades, se transformou – ou provavelmente sempre teve essa função – na grande autoridade que determina quais são os padrões aceitáveis de vida. É como se toda a existência, necessariamente, precisasse ser lógica, racional, planejada e organizada. A busca estafante da Ciência por leis universais dos fenômenos, sejam eles objetivos ou subjetivos, tem produzido explicacionismos que, ilusoriamente, ambicionam demonstrar a verdade de uma coisa ou acontecimento através do estabelecimento de sistemas teoricamente previsíveis e imutáveis, que funcionariam segundo regras específicas.

O repúdio extremado às contradições, em suas muitas possibilidades de manifestação, funciona como uma espécie de concretização dessa normatização do pensamento. É perceptível um certo consenso proibitivo implícito, presentes em diversos ordenamentos humanos, que atua condenando as quebras e desvios nas/das seqüência lógicas discursivas, formais ou não. Se alguém fala de uma coisa de certa forma, parece ficar obrigado a manter aquela mesma idéia por um tempo sem fim, tudo em nome da intocável coerência suprema. É como se, ao emitirmos determinada fala, estivéssemos fazendo uma promessa oculta de não contrariar aquelas palavras futuramente. A aversão àquilo que expressa a diferença e suas pluralizações, ossifica seres hierarquizados, serializados e tristes, que não desejam nada mais que a ordem e o poder.

Esse processo que evita as manifestações não lineares que jorraram e impelem para várias direções, articula-se de forma a impedir a vazão desejante singularizada. Mas os ímpetos criativos, alegres, sempre proliferáveis, podem sim implodir essas atmosferas conformativas que fabricam subjetividades mórbidas, descoladas das potências acíclicas de uma vida não transcendente, e estender outros solos, sempre móveis, onduláveis. O pensamento pode afirmar outras posições para além da cristalização lógico-racional das coesões demasiadas. É possível devir a diferença, reinventar relações, rearranjar temporalidades e criar territorialidades. As atividades-pensamento podem funcionar plasticamente, de maneiras moduláveis, desligado-se dos ideais de forma, de perfeição, das dialéticas sempre cíclicas, e se abrir às efemeridades desejantes fortuitas, acidentais, metamorfoseando-se incessantemente, espalhando/agregando partículas dos mais inimagináveis territórios existenciais.

Maicon Barbosa