Talvez não haja felicidade possível para mim. Tenho agora é uma dor de cabeça do tamanho do mundo. O pescoço pende com tanto peso. Ressaca de uma noite mau bebida. O corpo pedia pra ficar deitado, ouvindo os barulhos longínquos de carros passando e de vento. Por que é que me levantei pra escrevinhar essas porcas linhas? Ainda sinto areia na minha nuca. O mar estava tão bonito de manhã, no fim da bebedeira. Bonito e perigoso, chamando como sempre. Ouviam-se cantos de sereia ao longe: aí mora o risco! Era mar sem sol, prefiro. Espuma alva que deslizava como se fosse um prolongamento do céu cinza, carregado, melancólico. Águas sempre me fraquejam. Olho para a cama habitada apenas por um vestido amarrotado, sujo de areia e do meu corpo. Ninguém. A dor de cabeça ensaia passar. Agora sinto é a chuva que cai lá fora. Parece que ela sempre caiu mesmo quando não se podia ouvi-la. Ela me lava inteira, me faz nascer pro dia, pra uma vida sem esperança, sem otimismos, sem vontade de vencer. Mas, a pesar, ela faz nascer. Não sem antes desmanchar um monte de coisa. A dor de cabeça vai... Essa cólica de lugar incerto que saltou do corpo.
Ana Laura Navegueiro