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terça-feira, 24 de julho de 2007

Manifestos pós alguma coisa...



Os acontecimentos envolvendo protestos que expressam um desejo coletivo - seja ele qual for - são freqüentemente atacados por discursos reacionários que costumam classificar esses movimentos como desnecessários e insignificantes para a organização política, além de situá-los no rol dos fenômenos perigosos para a segurança da sociedade. Em meio a esses golpes desqualificantes que tentam fechar os protestos e manifestações que escapam da passividade dentro de um idealismo utópico, sonhado por uma juventude “hipnotizada”, ainda é possível pensar em outras possibilidades de atuação e conceituação dos movimentos macro e microssociais.
Apesar de muitas instituições partidárias constituírem diversos movimentos sociais, isso não significa necessariamente que toda manifestação coletiva tenha caráter partidário. A expressão desejante que aflora nesses acontecimentos não precisa estar vinculada a uma instituição com cadeias hierárquicas bem delimitadas. A legitimidade das manifestações está justamente no fato de que pessoas estão exercendo uma vontade convergente que não precisa de líderes suspensos para determinar o curso das coisas.
Existem alguns defensores da ordem que tentam estabelecer uma ligação causal e indissociável entre protestos resistentes e baixas “condições econômico-sociais”, se é que podemos usar tais termos. É como se os movimentos sociais de insatisfação com a ordem ocidental vigente só ocorressem nos lugares em que o perverso capitalismo ainda não realizou todos os seus milagres. No entanto, a revolta contra as formas capitalísticas de gerenciamento da vida, que operam em esferas materiais, desejantes, relacionais, entre outras, têm inundado muitos ambientes civilizados e superdesenvolvidos.
Os protestos contra o G8, que aconteceram em Rostock, na Alemanha, em Junho de 2007 (foto acima), é um nítido exemplo de que mesmo em sociedades conceituadas como “Primeiro Mundo”, pseudo-detentoras de um alto nível de “qualidade de vida”, muita gente anda se engasgando com as guloseimas fast-food que esse mercado de andróides empurra garganta “abaixo”! Obviamente a mídia de massa cria outros discursos em cima desses acontecimentos que acabam sustentando um imaginário centrado na periculosidade e violência dos movimentos.
Mas, independentemente da forma com que alguns veículos midiáticos focalizam certos acontecimentos coletivos desejantes, os movimentos resistentes em lugares públicos vão eclodindo com intensidades crescentes e densidades que aumentam gradualmente. Essas formas de protestos parecem ser uma das mais eficazes maneiras de "guerrear" contra a opressividade das máquinas de produção de determinados sentidos, que estruturam toda uma lógica de produção da necessidade de consumo, e que criam um desejo pela possessão de bens totalmente supérfluos e de pessoas-mercadorias, já que tudo – inclusive a vida humana – têm se transformado em produtos compráveis, consumíveis e descartáveis.


Maicon Barbosa

sexta-feira, 20 de julho de 2007

É A VIDA


É A VIDA...

Sair um pouco de si, da mente corriqueira, rotineira, cotidiana e previsível.
Sair um pouco do mundano, do conhecido, do que se dar por certo e do que se tem como perto.
A cidadezinha, aquela pequena cidade à qual se comparam os bairros das grandes metrópoles ou as vilas, onde todos sabem da vida de todos e ninguém presta atenção na própria.
Onde quase nada nunca acontece e quando acontece vira assunto para uma semana inteira.
Lugar de velhos aposentados ou vagabundos jogarem dominó, e donas de casa desocupadas assistirem novelas e fofocar nas horas vagas.
Provinciano, paroquiano, comum simples, fácil e entediante.Sim, tédio.
A melhor definição do normal e da normalidade, da razão e da racionalidade.
Aposentadoria e dominó.
Donas de casa, fofocas, novelas...
Províncias, paróquias e tédio...
É a vida...



Yon Macedo

quinta-feira, 19 de julho de 2007

O Estado Democrático Transcendente.



O conceito de transcendência vem sendo constantemente discutido nas mais variadas esferas do saber: filosóficas, artísticas, cientificas, ou nas inúmeras outras possíveis. No entanto, são raras as vezes em que se pensa o Estado moderno como transcendente. É obvio que existe uma gama de produções e pensamentos nessa perspectiva, porém, muito freqüentemente pensamos a questão da transcendência relacionando-a à idéia de Deus judáico-cristão, ou a alguma outra forma de religião. Não significa que essa forma de se perceber o transcendente seja equivocada, mas em inúmeras ocasiões nos esquecemos da forma em que os Estados democráticos modernos e pós-modernos estão estruturados. É de uma beleza estonteante o discurso de que “o poder emana do povo”, mas se formos pensar na configuração do Estado, não encontraremos nem vestígios do povo atuando. Iludimo-nos com a pseudo liberdade que o capitalismo nos dá, e ficamos seguros, já que vivemos num “justo” Estado de direito.
O capitalismo se tornou tão fragmentado e microrganizado nas suas maneiras de controle dos corpos e espaços, afetos e desejos, mercados e mercadorias, que não conseguimos mais imaginar um mundo sem essa incrível maquina de gerir a vida. O culto ao Estado ocorre em todo lugar. “Ele é a única maneira de vivermos juntos sem nos matarmos, sem entrarmos em uma guerra que levará à finitude da raça humana”. É esse o discurso defendido vigorosamente, já que nós, pobres mortais, somos incapazes de fazer qualquer coisa fora dessa imensa instituição controladora que não precisa de paredes ou divisórias. Não nos falta nem o totem sagrado, já que temos que respeitar reverentemente a nossa “amada e grandiosa” bandeira. Continuamos a olhar atônitos e hipnotizados para esse pretenso salvador e organizador de tudo, que paira sobre nossas cabeças. Mas chega de falatórios, continuemos o culto. Viva o Estado! Viva!


Maicon Barbosa

segunda-feira, 16 de julho de 2007

MARTA


Marta

Marta perdeu-se nos seus pensamentos
E entrou cada vez mais dentro de si
As pessoas chamavam, os pais choravam
O irmão se debatia
Marta nada sentia
E a cada dia, aumentava o desespero
Tal como gelo que se derrete
Tal como água que se evapora
A antiga Marta foi-se embora
Para algum lugar que talvez nem exista
E por mais que a família insista
Ela parece que não voltará

Marta abre os olhos
Um sorriso estranho cobri-lhe a face
Todos fazem festa
O irmão pula de alegria
Sem jamais prever a agonia, deste trágico despertar
Marta desconhece a todos
Palavras sem nexo são balbuciadas
Os olhos perdem –se em alguma imensidão
Ela não voltou, não pode ter voltado
O olhar dos familiares
Agora revoltados
E a felicidade sinistra da moça
Um ar de santa virgem mistura-se a de meretriz
Não fui culpa dela, não foi ela quem quis...

YON, 12/07/2007

sexta-feira, 13 de julho de 2007

Superficialidades


Deslizo pela face escorregadia da superfície.
Às vezes suavemente como se dançasse uma sublime valsa.
Outras, arrastando-me dolorosamente num solo abrasivo que
arranca pedaços de um corpo que se compõe, desmanchando-se com incrível velocidade.
Mas parece que sempre estou nela.
Dentro do fora da superfície, em mim, e que se estende
para além do campo de visão.
Em certos momentos sou tragado, sugado por crateras
que se abrem com velocidade de um acidente.
Quase imperceptivelmente caio em outras superfícies que passam.
Por onde anda a profundidade da vida e das coisas?
Como uma taça de frágil cristal que encontra uma outra
numa violência de beleza extrema, quebrando-se,
fragmentando-se e misturando pedaços que já não são seus
e que se indistinguem, assim vou me acidentando.
Confundindo as partes que voam por todos os lados.
Mesclando partículas alheias que ajunto em punhados, na profundidade
do ar que enche os pulmões asmáticos dos lugares que sou.

Maicon Barbosa






quarta-feira, 11 de julho de 2007

Escrivaninha



Da minha escrivaninha de frente para o mundo
Eu contemplo o vazio de tudo
A total falta de sentido com que o mundo ameaça-me
Complexos que me espreitam e iludem-me


Da minha escrivaninha de frente para tudo
Eu busco a potência existente no nada
E contemplo a minha total falta de vocação para a vida


Será que sempre chego atrasado
Para tudo que me espera?
Ou, na verdade, nada nunca me esperou?
Será que alguma coisa que aconteceu comigo tinha algum propósito?
Ou o propósito de tudo é não ter sentido algum?

Nunca consegui o que queria
Talvez não tenha conseguido por não saber o que era
Ou quem sabe eu tenha conseguido, mas não era para mim
Foi para os outros...

Contudo, agora parece tarde
Não me vale lamentações nem saudades
Pelo menos as ilusões já não me convencem
E as fantasias passam longe de mim.

Yon Macedo

terça-feira, 10 de julho de 2007




Quebra cabeça sem luz



Estranhamente o chão foge.
As mãos transbordam em gelado suor.
O peito emite sons frenéticos e descompassados, que tomam o corpo.
Corpo...
Que é envolvido pelas explosões interiores, com intensidade crescente, expansiva.
A cabeça sai do pescoço e anda, corre para além da vizinhança segura...
Vaga... Numa velocidade tão inconcebível que...
Não sei.
Não consigo agora.
Tenho vertigem, e giro fora do círculo.
As idéias se emaranham e deixam nós, muitos nós.
Tantos que as cordas já nem existem mais.
Tudo é nó, e desamarra.
O mundo se fragmenta.
Transforma-se em vários, outros, estranhos, novos, velhos...
Não sei.
Mundos que não são meus satélites me perpassam.
Sou um meteoro no vácuo.
Não há órbita alguma, nem direção.
Um choque!
Novo rumo sem rumo, e pedaços alheios.
Impacto e estrondo!
Fragmento-me, e espalho no vazio habitado, partículas que incomodam, aterrorizam às vezes.
Como é inconveniente incomodar a ordem das coisas!
Mas pelo menos isso ainda posso.
Desmancho como vapor d’água.
E monto sólidas estruturas com blocos de gelo nesse calor escaldante do deserto de belos prédios e lindas ruas, floridas com gente e medo.

Maicon Barbosa.